A tutela penal do embrião in vitro excedentário e patrimônio genético

fundamentos e limites das proibições de uso em pesquisa e de descarte de embriões na Lei de Biossegurança

Autores

  • Flavia Siqueira Universidade Presbiteriana Mackenzie
  • Italo Marqueti Universidade Presbiteriana Mackenzie

DOI:

https://doi.org/10.46274/1809-192XRICP2021v6n2p482-520

Palavras-chave:

biossegurança, embrião, Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais, teoria do bem jurídico

Resumo

A presente pesquisa visa a analisar os fundamentos morais e jurídicos que embasam a proteção penal do embrião in vitro excedentário para, posteriormente, determinar a legitimidade do crime previsto no art. 24 da Lei de Biossegurança (Lei no 11.105/2005). Esse tipo penal remete ao art. 5º do mesmo diploma legal, que define que somente poderá ser utilizado em pesquisa o embrião que seja inviável ou que esteja congelado há pelo menos três anos. Foram analisados e afastados argumentos que postulam que o bem jurídico protegido seria a vida, identificando-se o patrimônio genético, concebido como dado informacional genético humano, como alternativa adequada de bem jurídico. Verificou-se, ainda, que esse bem jurídico individual é de titularidade dos potenciais genitores, que têm interesse imediato em seus dados genéticos. Diante disso, conclui-se que a tutela definida atualmente pela Lei de Biossegurança retira o poder de disposição do titular do bem jurídico sem qualquer razão aparente, o que enseja sua ilegitimidade.

Referências

ABBAGNANO, Nicola. Dicionário de Filosofia. São Paulo: Martins Fontes, 2007.

ALBRECHT, Diego Alan Schöfer; SOUZA, Paulo Vinicius Sporleder de. Clonagem terapêutica e direito penal: fundamentos e limites da tutela do embrião in vitro. Revista Brasileira de Ciências Criminais, São Paulo, v. 108, p. 17-54, 2021.

ARE GENETIC DATA OF UNBORN CHILDREN SUBJECT TO DATA PROTECTION UNDER THE GDPR? Disponível em: https://gdpr.be/nederlands/genetic-data-unborn-children-subject-data-protection-gdpr/. Acesso em: 12 dez. 2021.

BADARÓ, Tatiana Maria. Bem jurídico-penal supraindividual. Belo Horizonte: D’Plácido, 2016.

BADARÓ, Tatiana Maria. Harm principle, bem jurídico e teoria da criminalização: fundamentos e limites da criminalização legítima em um Estado liberal. Tese (Doutorado em Direito) – Universidade Federal de Minas Gerais. Belo Horizonte, 2021. 708 f.

BERMEJO, Mateo; PALERMO, Omar. Diagnóstico genético preimplantacional: un estudio de derecho comparado en América Latina. In: KUDLICH, Hans; MONTIEL, Juan Pablo; ORTIZ DE URBINA GIMENO, Íñigo (Org.). Cuestiones actuales del Derecho Penal Médico. Madrid: Marcial Pons, 2017. p. 145-167.

BLACKBURN, Simon. Dicionário Oxford de Filosofia. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1997.

GRECO, Luís. Introdução à dogmática funcionalista do delito – Em comemoração aos trinta anos de política criminal e sistema jurídico-penal de Roxin. Revista Brasileira de Ciências Criminais, São Paulo, v. 32, p. 120-163, 2000.

GRECO, Luís. “Princípio da ofensividade” e crimes de perigo abstrato – Uma introdução ao debate sobre o bem jurídico e a estrutura do delito. Revista Brasileira de Ciências Criminais, São Paulo, v. 49, p. 89-147, 2004.

GRECO, Luís. Tem futuro a teoria do bem jurídico? Reflexões a partir da decisão do Tribunal Constitucional Alemão a respeito do crime de incesto (§ 173 Strafgesetzbuch). Revista Brasileira de Ciências Criminais, v. 82, p. 165-185, 2010.

GRECO, Luís; SIQUEIRA, Flávia. Promoção da saúde ou respeito à autonomia? Intervenção cirúrgica, exercício de direito e consentimento no direito penal médico. In: COSTA, José de Faria (Org.). Estudos em homenagem ao Professor Doutor Manuel da Costa Andrade. Coimbra: FDUC, v. 1, 2017. p. 643-669.

HARE, Richard. Abortion and the golden rule. Philosophy & Public Affairs, [s.l.], v. 4, n. 3, p. 201-222, 1975.

HEFENDEHL, Roland. O bem jurídico como a pedra angular da norma penal. In: GRECO, Luís; TÓRTIMA, Fernanda Lara (Org.). O bem jurídico como limitação do poder estatal de incriminar? Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2016. p. 57-75.

HILGENDORF, Eric. Introdução ao direito penal da medicina. Trad. Orlandino Gleizer. São Paulo: Marcial Pons, 2019.

KUSHE, Helga; SCARLETT, B. F.; SINGER, Peter. The moral status of embryos [with response]. Journal of Medical Ethics, [s.l.], v. 10, n. 2, p. 79-81, 1984.

MARQUIS, Donald. Abortion revisited. In: STEINBOCK, Bonnie (Org.). The Oxford Handbook of Bioethics. Oxford: Oxford University Press, 2007. p. 395-415.

MARQUIS, Donald. Why abortion is immoral. The Journal of Philosophy, [s.l.], v. 86, n. 4, p. 83-202, 1989.

MARTINELLI, João Paulo; SCHMITT DE BEM, Leonardo. Direito penal – Lições fundamentais. Parte especial: crimes contra a pessoa. 2. ed. São Paulo: D’Plácido, 2021.

MARTINS, Alessandra Batriz. Tutela penal do embrião humano in vitro. São Paulo: Cultura Acadêmica, 2013.

MCINERNEY, Peter. Does a Fetus Already have a Future-Like-Ours? Journal of Philosophy, Inc., [s.l.], v. 87, n. 5, p. 264-268, 1990.

MINAHIM, Maria Auxiliadora. Disciplina penal do uso das biotecnologias no Brasil: Lei nº 11.105, de 2005. In: SIQUEIRA, Flávia; ESTELLITA, Heloisa (Org.). Direito penal da medicina. São Paulo: Marcial Pons, 2020. p. 291 ss.

OLSON, Eric. Personal Identity. In: STICH, Stephen; WARFIELD, Ted (Org.). The Blackwell Guide to Philosophy of Mind. Oxford: Blackwell Publishing, 2003. p. 352-368.

OLSON, Eric T. Animalism and the corpse problem. Australasian Journal of Philosophy, [s.l.], v. 82, n. 2, p. 265-274, 2004.

PAWLIK, Michael. El delito, ¿lesión de un bien jurídico? Trad. Ivó Coca Vila. InDret Penal, Barcelona, n. 2, p. 1-15, 2016. Disponível em: https://indret.com/wp-content/uploads/2016/04/1222.pdf. Acesso em: 20 dez 2021.

PRADO, Luiz Regis. Biossegurança e direito penal. Revista dos Tribunais, São Paulo, v. 835, p. 415-433, 2005.

PRADO, Luiz Regis. Direito penal do ambiente: meio ambiente, patrimônio cultural, ordenação do território e biossegurança (com análise da Lei nº 11.105/2005). São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005.

PRADO, Luiz Regis. Tratado de direito penal brasileiro: parte especial. 4. ed. Rio de Janeiro: Forense, v. 2, 2021.

ROXIN, Claus. Reflexões sobre a construção sistemática do direito penal. Revista Brasileira de Ciências Criminais, São Paulo, v. 82, p. 24-47, 2010.

SANTOS, Humberto Souza. Ainda vive a teoria do bem jurídico? Uma contribuição ao debate sobre a teoria do bem jurídico e os limites materiais do poder estatal de incriminar. São Paulo: Marcial Pons, 2020.

SAVULESCU, Julian. Procreative beneficence: Why we should select the best children. Bioethics, [s.l.], v. 15, n. 5-6, p. 413-426, 2001.

SILVA DIAS, Augusto. What if everybody did it:sobre a (in)capacidade de ressonância do Direito Penal à figura da acumulação. Revista Portuguesa de Ciência Criminal, Coimbra, a. 13, n. 3, p. 303-319, 2003.

SILVA SÁNCHEZ, Jesús-Maria. “Diagnóstico de preimplantación” y derecho. Una valoración jurídica de la generación de embriones in vitro con la decisión condicionada. In: SIQUEIRA, Flávia; ESTELLITA, Heloisa (Org.). Direito penal da medicina. São Paulo: Marcial Pons, 2020.

SILVÉRIO D’AVERSA, Rafael Alberto. O problema moral do aborto e o argumento do futuro com valor. Dissertação (Mestrado em filosofia) – Universidade Federal de Santa Catarina. Florianópolis, 2014. 114 f.

SIQUEIRA, Flávia. Autonomia, consentimento e direito penal da medicina. São Paulo: Marcial Pons, 2019.

SIQUEIRA, Flávia; KASECKER, Izabele. Recusa de transfusão de sangue em pacientes menores de idade. Jota, São Paulo, [n.p.], 10 jun. 2019. Disponível em: https://www.jota.info/opiniao-e-analise/colunas/penal-em-foco/recusa-de-transfusao-de-sangue-em-pacientes-menores-de-idade-10062019. Acesso em: 12 dez. 2021.

STEINBOCK, Bonnie. Moral status, moral value, and human embryos: implications for stem cell research. In: STEINBOCK, Bonnie (Org.). The Oxford Handbook of Bioethics. Oxford: Oxford University Press, 2007. p. 416-440.

STONE, Jim. Why Potentiality Matters. Canadian Journal of Philosophy, [s.l.], v. 17, n. 4, p. 815-830, 1987.

SUMNER, Leonard Wayne. Abortion and Moral Theory. Princeton: Princeton University Press, 1981.

TOOLEY, Michel. Abortion and Infanticide. Philosophy & Public Affairs, [s.l.], v. 2, n. 1, p. 37-65, 1972.

VON HIRSCH, Andrew; WOHLERS, Wolfgang. Teoría del bien jurídico y estructura del delito. Sobre los criterios de una imputación justa. In: HEFENDEHL, Roland (Ed.). La teoría del bien jurídico. Madrid: Marcial Pons, 2007. p. 285-308.

WARREN, Mary Anne. On the moral and legal status of abortion. The Monist, [s.l.], v. 57, n. 1, p. 43-61, 1973.

Downloads

Publicado

31-12-2021

Como Citar

SIQUEIRA, F.; MARQUETI, I. A tutela penal do embrião in vitro excedentário e patrimônio genético: fundamentos e limites das proibições de uso em pesquisa e de descarte de embriões na Lei de Biossegurança. Revista do Instituto de Ciências Penais, Belo Horizonte, v. 6, n. 2, p. 482–520, 2021. DOI: 10.46274/1809-192XRICP2021v6n2p482-520. Disponível em: https://ricp.org.br/index.php/revista/article/view/106. Acesso em: 22 dez. 2024.

Edição

Seção

Artigos